Ampliação de UTI é questionada por pesquisadores e profissionais de Saúde

Publicado em: 29/03/2021

Pesquisadores, profissionais de saúde e representantes da sociedade civil criticaram a ênfase do Governo do Distrito Federal (GDF) na expansão de UTIs e defenderam investimento na inteligência epidemiológica como forma de combater a Covid-19. Eles apresentaram números e propuseram ações em Audiência Pública Remota da Câmara Legislativa sobre o tema, realizada nesta segunda-feira (29). De acordo com a pesquisadora do Instituto de Ciência Política da UNB, Michelle Fernandez, 80% dos pacientes em UTI não sobrevivem, taxa que tende a aumentar com abertura de mais leitos, com sobrecarga de trabalho e falta de profissionais capacitados. “Destinar a população a receber um leito de UTI é apenas dizer que vai ter uma morte mais suave”, afirmou.

Autor da audiência, o deputado Leandro Grass (Rede) defendeu um “pacto intersetorial, interinstitucional, social, coletivo e popular”, e anunciou a criação de um Comitê na CLDF, que reunirá câmaras técnicas e pesquisadores no acompanhamento das ações adotadas no DF. A carta aberta de lançamento do Comitê, lida por ele, defende que “as decisões tomadas pelo GDF sejam baseadas em dados e evidências, considerando a elevada carga de conhecimento científico disponível, mas que infelizmente vem sendo negligenciada”. Entre outros pontos, o distrital defendeu ênfase maior na inteligência epidemiológica, transparência sobre os critérios que definem as políticas, bem como auxílio a pequenos empresários e trabalhadores a fim de se adotar medidas restritivas mais eficazes.

A presidente do Conselho de Saúde do DF, Jeovânia Silva, afirmou que a entidade, com base em dados científicos, vem denunciando que “o manejo da pandemia estabelecido pelo DF está completamente equivocado ao ser centralizado exclusivamente na oferta de leitos de UTI”. Para ela, a solução é um “lockdown verdadeiro”, com apoio econômico para os mais vulneráveis e ao médio e pequeno empreendedor. Segundo ela, o DF registra apenas 38,2% de adesão ao distanciamento social, apesar de estar há mais de um mês sem vagas de UTI. “O que a gente está vendo é uma política de morte”, reforçou.

Para o professor da UNB Tarcísio Rocha Filho, há um “deslocamento” entre a quantidade de óbitos e de infectados, o que, segundo ele, sugere subnotificação de casos no DF. O Número Básico de Reprodução, que evidencia a quantidade de pessoas que cada infectado contamina, passa de 0,96, com base nos que testaram positivo, para 1,3, considerando o número de óbitos. Ele projeta que o DF chegue a até 10 mil mortes caso não sejam tomadas medidas mais eficazes. “Não há dicotomia entre isolamento e economia. Esse raciocínio é equivocado. A gente precisa sim adotar mais medidas de contenção de contatos sociais”, ressaltou.

Pandemia Perfeita

Para o professor e infectologista Jonas Brant, o país enfrenta o cenário da “pandemia perfeita”, com “falta de liderança e coordenação, ausência de sistema de comunicação de crise, um vírus respiratório com transmissão antes do início dos sintomas; agravamento da pequena parte dos casos com sobrecarga na assistência sem a sensação de risco; falta de investimento em pesquisa aplicada e na preparação nas emergências de saúde pública; desinvestimento em prevenção; e ausência de gestão com autores chaves dos territórios”. Entre outras medidas, ele defendeu aprimoramento no planejamento das ações; foco na prevenção; e estabelecimento de metas quantitativas e qualitativas.“Se apostarmos só na vacina, sem inteligência epidemiológica, vamos continuar tendo surtos”, alertou o infectologista Jonas Brant.

Presidente do Sindicato dos Enfermeiros do DF, Deyse Amarílio relatou que os profissionais de saúde têm sofrido com sobrecarga de trabalho, aumento do contágio, medo e falta de equipamentos de proteção individual. Também afirmou que há casos de chefias assediadoras e sem formação técnica. “Temos dificuldade de prestar um mínimo de assistência segura. Estamos agora sem monitores, sem bombas de infusão e sem respirador”, denunciou. Segundo ela, há 395 pacientes em espera de UTI, sendo 285 com Covid.

O senador Izalci Lucas (PSDB-DF), que integra a Comissão da Covid no Congresso, afirmou que não há problema financeiro no DF, mas apenas de gestão e planejamento: “O que falta é compromisso e competência, porque não faltam recursos”. Ele criticou “os escândalos de corrupção” na Secretaria de Saúde, a baixa taxa de testagem, bem como a falta de insumos e leitos de UTI. O coordenador do Comitê de Gestão Emergencial da Covid-19 da OAB-DF, Paulo Maurício Siqueira, defendeu empenho maior das instituições de fiscalização e controle sobre a gestão da pandemia. “Sem atuação dos órgãos e organização da sociedade civil, infelizmente é uma guerra perdida”, afirmou. Ele ainda criticou a falta de transparência nos critérios que estabelecem os grupos prioritários da vacinação no DF.

Presidente do Sebrae-DF, Valdir Oliveira defendeu uma renda mínima para os pequenos empreendedores, que deve partir do Governo Federal.

Oliveira contou que a busca pela consultoria gratuita do Sebrae bateu recorde ano passado, com 140 mil horas, e que apresenta novo aumento na demanda este ano: “Foram mais de 26 mil horas contratadas em janeiro e 36 mil em fevereiro”.

O presidente da Federação das Indústrias do DF, Jamal Bittar criticou a postura do Governo Federal em desestimular as ações de prevenção, como uso de máscaras, e “ameaçar boicotar” estados que adotarem lockdown. Para ele, o Legislativo está sendo responsável pelas iniciativas mais importantes, como o auxílio emergencial. “Não tenho nenhuma cerimônia em atribuir grande parcela dessas mortes à ausência de ação do Governo Federal”, criticou. Ele também defendeu a compra de vacinas diretamente por empresas para imunização dos funcionários e a implantação de um “robusto Refis Nacional”.

Ag.CLDF

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