De Boston – Um júri federal considerou ontem (4 de maio) quatro membros de um grupo extremista de direita, os Proud Boys, culpados de conspiração sediciosa pelo ataque ao Capitólio, nos Estados Unidos, no dia 6 de janeiro de 2021. Isso inclui o ex-líder do grupo, Enrique Tarrio, e os membros Ethan Nordean, Joseph Biggs e Zachary Rehl. Um quinto membro, Dominic Pezzola, foi considerado inocente dessa acusação. Mas ele e os outros quatro membros do grupo foram condenados por obstrução e destruição de propriedade.
O veredicto, que é parcial (outro tribunal acontecerá aproximadamente no mês de agosto para determinar as sentenças), foi proferido para esses membros do grupo em que mais de 20 de seus outros membros estão acusados de conexão com o ataque de 6 de janeiro.
A condenação é considerada uma vitória do Departamento de Justiça norte-americano. O procurador-geral da Justiça, Merrick Garland, disse, após o julgamento, que o departamento tem como garantido mais de 600 condenações por uma ampla gama de condutas criminosas em 6 de janeiro, bem como nos dias e semanas que antecederam o ataque, principalmente visando aqueles que lutaram, socaram, atacaram e até aplicaram choques em policiais que defendiam o Capitólio naquele dia.
Os promotores argumentam basicamente que esses homens se alinharam como uma força de combate ao ex-presidente Donald Trump e concordaram em fazer tudo o que podiam, incluindo a força, para manter Trump no poder e basicamente anular os resultados das eleições presidenciais de 2020.
Eles começaram a atuar nesse sentido a partir dos debates presidenciais, em que Trump pediu aos Proud Boys que “ficassem de prontidão”, e continuaram a atuar junto com Trump encorajando pessoas a virem ao Capitólio dizendo “será selvagem”. A justiça teve acesso a várias mensagens trocadas entre eles, vídeos e podcasts até no próprio dia 6 de janeiro, quando alguns desses homens estiveram envolvidos em algumas das primeiras violações no complexo do Capitólio naquele dia.
A defesa do líder do grupo tentou emplacar que Tarrio é um bode expiatório, “porque era muito difícil ou muito complicado para o Departamento de Justiça acusar Donald Trump de irregularidades”, e então o governo foi atrás de Enrique Tarrio que ‘nem’ estava em Washington, DC, no dia 6 de janeiro.
Mas o Departamento de Justiça apontou que Tarrio assistiu aos eventos de 6 de janeiro de um quarto de hotel em outro estado, Maryland, acompanhando da cidade de Baltimore, em parte porque estava com problemas “por desfigurar um banner em uma igreja afro-americana em DC em dezembro de 2020”. A Justiça provou ainda que Tarrio estava monitorando a ação de longe e às vezes dirigindo suas tropas no terreno. Eles localizaram uma mensagem de chat em que Tarrio postou em 6 de janeiro, dizendo: “Não tenham dúvidas, NÓS fizemos isso.”
A defesa ainda tentou retratar os réus como “um grupo que gosta de festas e bebidas”. Mas o Departamento lançou uma sombra muito mais sombria e provou que havia pessoas fomentando ativamente a violência, encorajando-a, postando vídeos, expressando-se como os chamados ‘senhores da guerra’ e comemorando a vitória após o cerco ao Capitólio.
A defesa tentou dissociar a cultura dos “garotos festeiros dos Proud Boys” da cultura dos garotos dos comícios de Trump. Mas o júri aceitou os resultados da investigação do Departamento de Justiça de que esses réus estavam empenhados na violência em 6 de janeiro desde antes.
Anteriormente o Departamento de Justiça condenou como sediciosos membros de outro grupo extremista de direita, os Oath Keepers e em sua atuação em 6 de janeiro. A condenação pelo Departamento de Justiça de conspiração sediciosa, com sucesso, de líderes de ambos os grupos de extrema direita, os Oath Keepers e os Proud Boys, são as acusações mais sérias até então dessa extensa investigação de 6 de janeiro.
E isso certamente é uma confirmação da estratégia do Departamento de Justiça neste caso. Essas acusações são muito difíceis de provar. Agora eles provaram que os líderes de dois grupos diferentes de extrema-direita que desempenharam um papel enorme no terreno em 6 de janeiro estavam engajados em um esforço violento para derrubar o governo. Isso é significativo como parte dessa investigação mais ampla, que continua, como disse para a imprensa , o procurador-geral da Justiça.
QUEM SÃO OS PROUD BOYS
Os Proud Boys são um grupo extremista de direita. Eles foram fundados em 2016. Eles se autodenominam uma organização ‘chauvinista’ ocidental. O termo vem do nome do soldado francês de Napoleão, Nicolas Chauvin, que foi gravemente ferido nas guerras napoleônicas e recebeu uma pensão miserável por seus ferimentos. Após a abdicação de Napoleão do império, Chauvin teria mantido a sua crença fanática bonapartista na missão messiânica da França imperial e se devotou à causa de forma obstinada.
Isso incluía uma crença na superioridade e dominância do próprio grupo ou povo, que se vê como “machos fortes e virtuosos”, enquanto outros diferentes desse perfil seriam fracos, indignos e inferiores. Embora não faça alusão direta a raça, o termo carrega uma associação indireta com eugenismo e supremacia branca. O termo associa-se também a um extremo patriotismo e nacionalismo, e mesmo um fanatismo acreditando na excelência de certa camada do povo e glória nacional.
PROXIMOS PASSOS
O julgamento dos Proud Boys é considerado parcial porque de acordo com o sistema de Justiça dos EUA, essa condenação é inicial. Em agosto deve haver o sentenciamento. Então, quando eles forem sentenciados, esses homens certamente enfrentarão uma longa pena de prisão. Alguns deles devem pegar um máximo de 20 anos atrás das grades.
O julgamento dos Proud Boys foi bastante barulhento. A defesa promete recurso e pede até “anulação”. Ao longo do julgamento, houve vários pedidos de obstrução. Todos os advogados de defesa levantaram objeções e pediram registro. Eles esperam e depositam esperanças nos tribunais de apelação.
Cerca de 900 pessoas estão ainda presas e formalmente acusadas pelo ataque de 6 de Janeiro. Até o momento, e dentre os extremistas que ocuparam papel de liderança nos ataques, foram julgados Stewart Rhodes e Kelly Meggs ––fundador e chefe do capítulo da Oath Keepers na Flórida–– e Jacob Chansley, da QAnon. Este último, sentenciado a 41 meses de prisão, foi um dos primeiros réus criminais entre mais de 660 que estão recebendo uma punição.
Qualquer semelhança com o que aconteceu no Brasil em 8 de Janeiro em 2023 e seus desdobramentos, atualmente com várias pessoas presas, acusadas e que muito em breve começarão a ser julgadas não é mera coincidência.
Ana Alakija é jornalista com Mestrado em História pela Salem State University, Massachusetts